quinta-feira, 13 de agosto de 2015

OS MORTOS PODEM VOLTAR? E SAUL COM MÉDIUM DE EN-DOR?




Vendo a mulher a Samuel, gritou em alta voz; e a mulher disse a Saul: Por que me enganaste? Pois tu mesmo és Saul. Respondeu-lhe o rei: Não temas; que vês? Então, a mulher respondeu a Saul: Vejo um deus que sobre da terra. Perguntou ele: Como é a sua figura? Respondeu ela: Vem subindo um ancião e está envolto numa capa. Entendendo Saul que era Samuel, inclinou-se com rosto em terra e se prostrou.
(1 Samuel 28. 12-14)

Esse texto narra o que ocorreu com Saul no final da sua vida, devido ao desespero que vivia por Deus ter o deixado, Samuel era morto e os filisteus estavam acampados diante de Israel para a guerra e Davi estava naquele momento entre os filisteus (28.3-5). Por causa de toda essa situação o medo dominou o coração de Saul! Como Deus já o respondia, foi disfarçado desesperado  consultar uma médium em Em-Dor (28. 6-8). Com esse contexto imediato em mente podemos entender um pouco a passagem acima.
É importante que você saiba que uma passagem “narrativa” se propõe apenas a narrar o fato histórico sem entrar em detalhes se aquele ato foi bom ou ruim aos olhos do Senhor, com raríssimas exceções o autor coloca que Deus não aprovou o que ocorreu (2 Sm 11.26-27).
Como podemos interpretar uma passagem narrativa? Vou apresentar alguns princípios:
§  O primeiro princípio é utilizar os mandamentos do Senhor para avaliar se aquela experiência narrada é correta ou não: No caso da consulta de Saul a médium de Em-Dor existem mandamentos que claramente condenam essa atitude antes de Saul. Em Levítico 20. 27 a lei diz que o israelita que consultasse os mortos por meio de necromante deveria ser morto apedrejado, para que servisse de exemplo para os outros e a não toda não fosse condenada ao ser influenciada por essa prática pagã. Em Deuteronômio 18. 9-14 é a repetição da Lei para o povo de Israel antes de entrar na terra prometida, dentre várias ordens que são dadas pelo Senhor por meio de Moisés, é repetido a ordem de não imitarem as nações que viviam em Canaã, que queimavam seus filhos como sacrifico aos seus deuses pagãos, consultavam os mortos. Por essa razão a médium de Em-Dor estava com medo de ser morta ao descobrir que era Saul o que a consultava (28. 9,12)! Outros textos nas Escrituras reafirmam a condenação àqueles que consultam os mortos (1 Co 6.9-11; Ap 21.8).
§  Segundo princípio é observar no próprio texto narrativo incoerências na experiência: O que desejo dizer com isso é que a leitura da narrativa, que narra o fato como realmente ocorreu, revela alguns detalhes que lançam luz para uma correta interpretação. Observe esses detalhes no texto:
a)      Saul estava disfarçado para não ser reconhecido pela médium (28.8)
b)      A mulher pergunta quem deveria subir dos mortos (28.11). Ela não era médium? Porque a pergunta sobre quem deveria subir dos mortos?
c)      É a mulher que vê o suposto Samuel e não Saul (28.12). A visão toda parte da mulher e não de Saul.
d)      Ela não viu claramente que era Samuel, disse que via um deus que subia da terra, um ancião envolvido por uma capa (28.13-14). A descrição mostra uma seção espirita, semelhante ao que ocorre ainda hoje, onde a pessoa tem uma visão espiritual de um suposto morto e depois é possuída por esse espírito maligno disfarçado e fala com a pessoa.
e)      Saul entendendo, deduzindo que fosse Samuel, inclinou-se com o rosto em terra e se prostrou (28. 14). Saul estava emocionalmente amedrontado e desesperado por acreditar que Samuel pudesse voltar dos mortos para falar com ele, o que naturalmente contribuiu para que “entendesse” que fosse realmente o profeta.
f)       A partir do verso 15 não é dito que a mulher fala, somente depois da profecia contra Saul ter terminado que a mulher volta a falar diretamente a Saul (28. 21-25). Lembra que Saul não tinha visto Samuel, deduziu que fosse ele, quem viu foi a médium, como então, agora Samuel fala diretamente para Saul? É porque a mulher após ter a visão do suposto Samuel, é possuída pelo espirito maligno que fala através dela com voz semelhante a de Samuel para enganar a Saul, é claramente uma sessão espirita!
g)      Como posso afirmar que não se tratava do verdadeiro Samuel? Por algumas razões: 1) a profecia do suposto Samuel não se cumpriu cabalmente, quando afirmou que Saul e todos os seus filhos seriam mortos na guerra, Is-Bosete não morreu. Para ser um profeta verdadeiro da parte do Senhor era necessário que sua profecia se cumprisse completamente (Dt 18. 15-22; 1 Sm 28.19; 2 Sm 2. 8-10, 4.5-12; ); 2) Samuel era um verdadeiro profeta, logo, o ancião da visão da mulher não poderia ser Samuel, então quem era? Tratava-se de um demônio designado para ser um espirito de mentira na boca da médium, como a Escritura afirma ter ocorrido algumas vezes, como no caso do espirito mentiroso permitido pelo Senhor para enganar o rei Acabe por meio dos falsos profetas, para que este rei perverso morresse na guerra contra a Síria (1 Rs 22. 19-22); 3) Mortos não voltam para trazer notícias ou profecias para os vivos, só voltam a vida por meio da ressurreição que são tipologias[1] da ressurreição final (Jo 11. 23-27), o que não é o caso do suposto Samuel. Jesus deixou claro que é impossível o retorno dos que morreram para trazer alguma notícia ou aviso aos vivos e depois retornarem ao seu estado de morte, ao contar a parábola do rico e Lazaro, onde o rico pede a Abraão pra voltar e avisar seus irmãos, para que os mesmos não fossem pra o inferno (Lc 16. 27-31). Em Hebreus o autor ao defender que o sacrifício de Cristo foi realizado uma única vez para remissão de pecados, utiliza como exemplo para provar esse argumento o fato do homem morrer uma única vez e depois disso vem o juízo (9. 23-28).
Acredito que estes argumentos sejam suficientes para dar diretrizes quanto à interpretação de uma narrativa bíblica! É um grave erro as pessoas usarem narrativas para afirmar que viverão experiências semelhantes, sejam boas ou ruins. Cada narrativa tem seu propósito revelacional e deve ser entendido dentro do contexto geral das Escrituras.

Márcio Willian Chaveiro
(parte da apostila de Hermenêutica do Instituto Bíblico Graça Irresistível)





[1] Tipologia é uma forma prévia e limitada que aponta para um cumprimento absoluto e perfeito. A ressurreição desses mortos na Bíblia tanto pelos profetas, apóstolos e principalmente por Cristo, apontavam para a ressurreição final, como o próprio Senhor Jesus ensinou a Marta antes de ressuscitar Lazaro (Jo 11. 23-27).

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