Essa
é uma discussão interminável no meio teológico, a liberdade moral do homem. Atualmente,
com um despertar na juventude cristã em estudar a Teologia Reformada, esse tema
da liberdade humana tem sido um dos pontos mais discutidos na internet. Alguns
utilizam desse ponto de discussão para irresponsavelmente promover debates
inúteis, que em nada contribuem para o crescimento da igreja em Cristo. Anthony
Hoekema fala que essa discussão acalorada e muitas vezes infrutífera
teologicamente em alguns casos, é antiga:
...Tem havido
muito debate sobre esse assunto. Algumas vezes, essa discussão tem gerado mais
calor do que luz por causa da ambiguidade de vários termos que são usados.
Palavras como livre, liberdade, volição e vontade podem adquirir significados
tão diversos que as pessoas envolvidas no debate sobre a liberdade humana podem
estar falando a mesma linguagem com sentido completamente diferente[1].
Preciso
esclarecer que o termo “livre arbítrio”
(no latim é liberum arbitrium) não é um termo bíblico, mas filosófico e
teológico. A sua origem vem do “estoicismo”[2] e
devido a convivência da filosofia grega com o cristianismo a partir do segundo
século, ela tornar-se um termo teológico. A partir de então, foram tentados
várias formas de dar sentido teológico a partir das Escrituras.[3]
Por esse histórico, já devemos entender que toda a discussão sobre esse tema,
como também dos demais, deve ser tratado com os limites das Escrituras e não da
Filosofia. O teólogo Hoekema entende que esse termo “livre arbítrio” é infeliz e prefere usar “escolha ou verdadeira liberdade”.[4]
Como
é comum o uso desse termo “livre arbítrio”, utilizarei com fins didáticos.
Também definirei outro termo igualmente utilizado na Sistemática, a “livre
agência”. O entendimento desses dois termos contribuirão muito para o nosso
estudo.
Livre arbítrio
Na
visão humanista o livre arbítrio é:...uma crença religiosa
ou uma proposta filosófica que
defende que a pessoa tem o poder de decidir suas ações e pensamentos segundo seu
próprio desejo e crença...[5]
Basicamente, entende-se que a vontade governa
independente das outras faculdades da natureza humana as nossas decisões. Mas a
nossa visão é conduzida pelas Escrituras e não pela filosofia. Cremos que o livre arbítrio é a
capacidade de viver em conformidade perfeita com a vontade de Deus ou não, e
que somente Adão no estado de inocência teve essa liberdade.
Quando
Deus criou Adão, ele era perfeito, santo e integro, mas como um ser livre
moralmente, podia tomar decisões contrárias à sua natureza santa, que chamamos
de livre arbítrio. Se livre arbítrio foi entendido como sendo a liberdade da
vontade independente das outras faculdades do homem, então, não existe livre
arbítrio. Assim afirmou Berkhof:
A vontade humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, uma coisa
solta no ar, e que pode pender arbitrariamente numa ou noutra direção. Ao invés
disso, é uma coisa arraigada em nossa natureza, ligada aos nossos mais
profundos instintos e emoções, e determinada por nossas considerações
intelectuais e por nosso próprio caráter.[6]
Por essa
razão, quando Adão pecou contra Deus, todo o seu ser foi afetado pelo pecado, e
não somente a vontade. A sua razão, suas afeições, seus desejos, sua carne,
tudo foi atingido pelo pecado. E tudo deverá ser restaurado em Cristo! Vemos no
relato bíblico claramente que Adão era em sua natureza uma integralidade de
todas as faculdades:
a) Um ser
Pessoal, racional, moral, com afeições (Gn 1.27)
b) Um ser
relacional (Gn 2. 23-24)
c) Um ser com
vontade própria (Gn 3.6)
d) Um ser
capaz de estabelecer julgamentos (Gn 1. 28)
e) Um ser
religioso (Gn 2.1-3)
f) Um ser
autoconsciente (Gn 2.20)
g) Um ser
responsável por seus atos (Gn 2.16-17)
Se
Adão não pudesse tomar decisões contrárias a sua natureza santa, que sentido
teria a ordem de Deus para não comer da arvores do conhecimento do bem e do mal
(Gn 2. 16-17)? Quando Adão peca contra Deus, o faz consciente da sua
desobediência, ele pensa, reflete e come, não faz simplesmente movido por
vontade (Gn 3. 6-7).
Livre Agência
Como o homem perdeu sua capacidade natural de
obedecer a Deus plenamente com a Queda de Adão, ele não desfruta de livre
arbítrio após a Queda, mas tem a livre agência, age em conformidade com sua
natureza. A livre agência é a liberdade do homem de tomar decisões morais a
partir da sua natureza pecaminosa e a inabilidade de tomar decisões contrárias
a sua natureza. Significa que ele é escravo de si mesmo! Calvino cita Agostinho
nesse ponto, que afirmou que: o homem,
fazendo mau uso do livre-arbítrio, perdeu-o, e perdeu-se, e que o “livre-arbítrio está em cativeiro e não pode
fazer bem algum”.[7]
Logo, a livre agência é a expressão máxima desse cativeiro em que o homem vive,
presumindo ser livre em suas escolhas! Ele não é manipulado por Deus, é
manipulado por si mesmo, pelos seus pecados escravizadores.
A
Confissão de Fé de Westminster em seu capítulo IX, 1 e 2, assim declara sobre o
estado original do homem e sua liberdade de escolha (1): Deus dotou a vontade do de tal liberdade natural, que ela nem é forçada
para o bem nem para o mal, nem a isso é determinada por qualquer necessidade
absoluta de sua natureza. Em seguida a Confissão diz (2): O homem, em seu estado de inocência, tinha a
liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas
mudavelmente, de sorte que pudesse decair dessa liberdade e poder.[8]
A Confissão de Fé Batista de 1689 faz uma esclarecedora declaração sobre os
efeitos do pecado na liberdade humana, retirando o seu livre arbítrio e
escravizando-a:
Deus dotou a vontade humana com a liberdade e o poder natural de agir
por escolha, sem ser forçada ou predeterminada por alguma necessidade para
fazer o bem e o mal.
O homem, em seu estado de inocência, tinha a liberdade para fazer bem
ou o mal. O homem em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de
querer e fazer aquilo que era bom e agradável a Deus. Essa, porém, era uma
condição mutável, pois o homem podia decair dessa liberdade de poder.
Com a Queda no pecado, o homem perdeu completamente toda a sua
habilidade volitiva para aquele bem espiritual que acompanha a salvação. Por
isso, o homem natural é inteiramente adverso a esse bem, e está morto em
pecados. Ele não é capaz de se converter por seu próprio esforço, e nem mesmo
de se dispor a isso.
Quando Deus converte um pecador, e o transfere para o estado de graça,
Ele o liberta da sua escravidão natural do pecado, e, somente pela graça, o
habilita a livremente querer e fazer aquilo que é espiritualmente bom. Mesmo
assim, por causa de certas corrupções que permanecem, o homem redimido não faz
o bem perfeitamente e nem deseja somente aquilo que é bom, mas também o que é
mau.
Somente no estado de glória a vontade do homem será transformada,
perfeita e imutavelmente; e então será livre para fazer apenas o bem.[9]
Um
bom exemplo com relação a essa inabilidade do homem após a Queda em fazer a
vontade de Deus naturalmente, são nossas escolhas que são limitadas ao que
esteja em sintonia com a nossa natureza. Por exemplo, um homem pode escolher
atravessar ou não uma ponte, o que ele não pode escolher é voar sobre a ponte
-- a sua natureza o impede de voar. De forma semelhante, um homem não pode
escolher tornar-se justo - sua natureza (pecaminosa) o impede de cancelar a sua
culpa (Romanos 3:23). Assim, o livre-arbítrio é limitado pela natureza.[10]
Com
essa perspectiva precisamos avaliar biblicamente como aplicar o livre arbítrio
para o homem nos seguintes estágios: a)
antes da Queda; b) após a Queda; c) Estado de Glória.
Primeiro
Estágio:
O Livre Arbítrio
Antes da Queda
Antes da Queda Adão era
moralmente livre, santo e puro. Suas decisões morais estavam de acordo com sua
natureza santa, contudo ele podia tomar decisões contrárias a sua natureza.
Adão possuiu essa capacidade de fazer tudo o que era justo e santo, mas também
foi dotado com a capacidade de fazer alguma coisa que era contrária à santidade
com que foi originalmente criado. Ele possuiu aquilo que ninguém hoje mais
possui, isto é, a capacidade de fazer algo que é contrário à sua natureza
moral. Ele teve, nesse sentido, a capacidade para uma escolha contrária, isto
é, com natureza santa, escolheu o que era mau.[11]
Adão foi criado com o
livre arbítrio, ou seja, a capacidade de fazer algo contrário à sua natureza
santa, como também com a livre agência, a liberdade de agir de acordo com sua
natureza. O homem não foi criado com uma indiferença moral, se assim fosse,
permaneceria dessa forma sem agir de modo algum! A indiferença moral ou total
neutralidade é impossível a nossa natureza, mesmo antes da Queda. Deus criou o
homem santo, mas com uma santidade mutável. O homem é movido pelo seu interior,
sua inclinação natural, que após a Queda é o pecado que o move em todas as
direções.
Segundo Estágio:
Após a Queda
Toda
a natureza humana foi afetada pelo pecado, sua inclinação natural é para o mal.
O Livre arbítrio foi completamente perdido na Queda, o homem agora possui
apenas a livre agência. Significa que tanto o ímpio, como o crente, age de
acordo com sua natureza. No caso do crente, ele tem duas naturezas, o novo
homem e o velho homem, a que for mais alimentada é que guiará a decisões
morais. O ímpio tem apenas a natureza corrompida, e age em conformidade com sua
natureza caída (Rm 3. 9-23). Francis Schaeffer comentando essa passagem citada,
diz:
Na verdade, o homem é uma
maravilhosa criação de Deus. Acontece que ele também é um ser rebelado contra
Deus e merece a ira de Deus. O homem não é um ser patético, o homem é um ser
rebelde. Não é como se o homem estivesse desesperadamente preso em uma rede da
qual não tivesse como escapar; ele está preso numa rede, certo, mas ele está lá
por opção própria. E se homens e mulheres estão presos nesta rede por escolha
própria, diz a Bíblia, então há algo mais em jogo: eles precisam aceitar a
responsabilidade, a culpa por estar ali.[12]
O
Dr. Heber Carlos de Campos mais uma vez contribui para elucidar essa diferença
de ação moral com a Queda:
Mas é importante que não percamos de vista
este ponto: o ser racional é sempre movido pelo seu ego. Nunca ele é movido por
outra coisa que não seja por seu próprio ego. Quando ele faz coisas
pecaminosas, ele obedece ao seu ser interior pecaminoso. Quando ele faz coisas
santas e justas, ele o faz mediante o seu eu interior que foi renovado pelo
Espírito Santo. A responsabilidade dele sempre estará diretamente ligada à
voluntariedade do seu ato. Todos os atos dele devem ser auto-inclinados e
auto-determinados. O homem possui responsabilidade em tudo que faz, porque tudo
que faz é produto das disposições de sua natureza interior.[13]
A
Confissão de Fé de Westminster (IX, 3) assim declara acerca do homem após a
Queda e os efeitos do pecado em sua natureza:
O homem, ao
cair no estado de pecado, perdeu inteiramente todo o poder de vontade quanto a
qualquer bem espiritual que acompanhe a salvação; de sorte que um homem
natural, inteiramente avesso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu
próprio poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso.[14]
Figura
1
A figura 1 ilustra a totalidade da natureza humana e revela que o homem foi totalmente afetado pelo pecado, e vive em conformidade com essa natureza corrompida. Logo, o homem age de acordo com suas convicções e inclinações internas. Ele é o que sua natureza é. Não existe nele a condição, após a Queda, de tomar decisões contrárias a sua natureza, apenas age em conformidade com ela. Por isso o crente depende da capacitação e graça de Deus em seu ser para tomar decisões santas. O apóstolo Paulo revela essa ação moral de responsabilidade do crente e a ação conjunta do Senhor em leva-lo a agir (Fl 2. 12-13):
Assim,
pois, amados meus, como sempre obedecestes, não só na minha presença, porém,
muito mais agora, na minha ausência, desenvolvei a vossa salvação com temor e
tremor; porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar,
segundo a sua boa vontade.
O
Senhor age poderosamente em nossa nova natureza em Cristo nos capacitando a
obedecer a sua vontade e ser progressivamente recriado em Cristo. Esses irmãos
de Filipos deveriam, mesmo na ausência de Paulo, desenvolver a santificação no
viver diário todo o tempo de suas vidas, se esforçando ao máximo. Mas os
cristãos de Filipos deveriam também entender que não poderiam produzir frutos
de justiça sem que Deus os capacitassem a isso. Como disse o Senhor Jesus (Jo
15.4): Como não pode o ramo produzir
fruto de si mesmo, se não permanecer na videira; assim nem vós o podeis dar, se
não permanecerdes em mim. Da mesma forma, os filipenses só poderiam operar
a sua própria salvação permanecendo num vivo e ativo contato com Deus.[15]
Assim é com todos os crentes.
Terceiro Estágio:
Estado
de Glória
No estado de glória
todas as maldições, pecados, dor e sofrimentos serão completamente removidos
(Ap 21.4): E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá,
já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras cousas passaram.
Será a consumação de todas as Promessas Redentoras, o Reino de Deus restaurado
pelo Cristo e entregue ao Pai (1Co 15.20-28). O pecado não foi criado por Deus,
não fazia parte da nossa natureza original, portanto, pode ser removido
completamente pela representação de Cristo, o segundo Adão (Rm 5. 17).
E a vontade humana, como ficará no estado de
glória? Primeiro, precisamos entender que a vida eterna se inicia no momento da
regeneração e conversão. Somos nesse momento libertados da escravidão do pecado
e caminhamos no processo da santificação em Cristo (Rm 6. 18): e, uma vez libertados do pecado, fostes
feitos servos da justiça. Mas mesmos salvos pela graça, lutamos contra o
velho homem diariamente, pois temos duas naturezas, a do Velho Homem e a do
Novo Homem, que viverão em conflito até aquele Dia em que seremos completamente
transformados em glória (Rm 7. 20-25; Ef 4. 17-32; Cl 3. 5-11).
Em segundo lugar, como crentes temos duas
naturezas, uma santa e uma ímpia, o que já expliquei anteriormente. Logo,
caminhamos em direção a Cristo lutando contra os nossos desejos pecaminosos que
fazem guerra em nosso interior, precisamos mortificar a velha natureza (Cl 3.
5): Fazei, pois, morrer a vossa natureza
terrena; prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza,
que é idolatria. Tiago também afirmou que as lutas ocorrem dentro de nós,
por causa dos nossos desejos pecaminosos (Tg 4.1): De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão
dos prazeres que militam na vossa carne? Portanto, da nossa conversão até o
momento que nos encontraremos com Cristo, temos que caminhar com perseverança a
carreira que nos está proposta, desembaraçando de todo o peso e pecado que nos
cerca o tempo todo (Hb 12. 1-3)! Temos que prosseguir para o alvo, para o
prêmio da soberana vocação em Cristo (Fl 3. 12-16). Sabendo que sempre
travaremos guerra contra a nossa velha natureza, como se carregássemos amarrado
ao nosso corpo um cadáver apodrecendo (Rm 7.24): Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?
Somente quando Cristo voltar seremos transformados a sua imagem e semelhança e
nos veremos completamente livres dessa velha natureza inimiga da nova natureza
que se refaz em pleno conhecimento de Cristo (Cl 3.10)! A Confissão de Fé de
Westminster nos ajuda a entender esse ponto ao dizer (IX, 4):
Quando Deus converte um pecador e o
transfere para o estado de graça, ele o liberta de sua natural escravidão ao
pecado e, somente por sua graça, o habilita a querer e a fazer com toda
liberdade o que é espiritualmente bom, mas isso de tal modo que, por causa da
corrupção ainda existente nele, o pecador não faz o bem perfeitamente, nem
deseja somente o que é bom, mas também o que é mau.[16]
Terceiro, no estado de glória seremos livres
completamente de qualquer influencia interna ou externa do pecado. Não teremos
livre arbítrio como Adão, porque não teremos a possibilidade de pecar, de
escolher alguma coisa contrária a nossa natureza santa. Continuaremos a ter a
livre agência, agiremos em conformidade com a nossa natureza perfeita, santa e
reta perante o Senhor! Em Cristo, nunca mais teremos a possibilidade de pecar
contra o nosso Deus (Rm 8.29). A glória de Cristo será revelada em nós (Rm 8.
18). E cantaremos diante daquele que está no trono e ao Cordeiro que está ao
lado (Ap 7. 10): ...Ao nosso Deus, que se
assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação.
Logo, somente no estado de glória
desfrutaremos da consumação da vitória de Cristo na cruz em nosso lugar, e
seremos completamente transformados a imagem de Deus. A nossa vontade será
livre de acordo com a nossa natureza redimida, e alegremente louvaremos ao
Senhor por todo o sempre! Concluo essa parte com a afirmação da Confissão de Fé
de Westminster (IX, V): É no estado de
glória que a vontade do homem se torna perfeita e imutavelmente livre para o
bem só.[17]
O Conceito Reformado
de
Liberdade Humana
O Dr. Heber deu aula para mim e outros colegas
no curso de convalidação de teologia na Universidade Presbiteriana Mackenzie de
Antropologia, e na ocasião fez um slide que exemplificava o ponto de vista
Reformado sobre o Livre Arbítrio do homem e outro quadro com a visão humanista
do mesmo. Abaixo coloco na íntegra a forma que nos foi exposto pelo brilhante
professor:
Estados do Homem
|
Liberdade Natural
(Livre Agência)
|
Liberdade Espiritual
|
Liberdade de Escolha (Livre Arbitrio)
|
ESTADO DE SANTIDADE
|
SIM
|
SIM
|
SIM
|
ESTADO DE PECADO
|
SIM
|
NÃO
|
NÃO
|
ESTADO DE GRAÇA
|
SIM
|
SIM
|
NÃO
|
ESTADO DE GLÓRIA
|
SIM
|
SIM
|
NÃO
|
Definindo
cada conceito de liberdade do homem, conforme o quadro:
a)
Liberdade Natural: é o mesmo que liberdade de agência, a
capacidade que os seres racionais têm de fazer quaisquer coisas que eles
querem, gostam, de acordo com a sua natureza.
b)
Liberdade Espiritual: é a capacidade dada aos cristãos de fazerem
coisas que agradam a Deus, em conformidade com suas leis santas e justas, no
caso do crente, faz em Cristo.
c)
Liberdade de Escolha Contrária: é o mesmo que livre arbítrio, a capacidade
de agir contrária a natureza. Nesse caso, nem mesmo Deus tem essa liberdade,
porque age de acordo com sua natureza santa e perfeita e jamais poderá agir
contra a sua natureza!
Como
no inicio disse sobre esse aspecto na antropologia bíblica, é um assunto
extremamente complexo e cheio de desafios para uma construção correta sobre a
liberdade moral do homem. Podemos ir até onde a Escritura vai, submeter essa
revelação a nossa limitada compreensão é no mínimo tolo!
O
grande teólogo de Genebra, João Calvino faz uma didática explicação sobre a
forma como Satanás governa os ímpios, conduzindo suas naturezas caídas a rebeldia
contra Deus:
...O que se
diz, então, é que a vontade do homem natural está sujeita ao senhorio do Diabo,
sendo por ele conduzida, o que não significa que seja constrangida pela força e
sem a sua aprovação, como se força um servo ou um escravo a fazer o trabalho,
por mais que este o deteste. Nós entendemos, porém, que, sofrendo os abusos e
as mentiras do Diabo, é por necessidade, e não por constrangimento, que a
vontade se sujeita a obedecer ao que o Diabo quer. Sim, porquanto aqueles que
não recebem de Deus a graça de serem governados por seu Espírito, são
abandonados e deixados com Satanás, para serem conduzidos por ele. Por essa
causa, diz o apóstolo Paulo que o Deus deste mundo (o Diabo) cegou o
entendimento dos incrédulos para que não vejam a luz do evangelho. E, noutro
lugar, diz ele que o Diabo reina em todos os ímpios e desobedientes. A cegueira
de todos os praticantes do mal e todos os malefícios resultantes são
declaradamente obras do Diabo, e, todavia, não é preciso procurar a causa fora
da vontade humana, da qual procede a raiz do mal e na qual está a base do reino
do Diabo, quer dizer, o pecado.[18]
O
Diabo governa o entendimento dos ímpios, mas os ímpios são prazerosamente
governados pelo Diabo! A natureza caída é rebelde ao Senhor e Satanás utiliza
dessa realidade existencial dos ímpios para os conduzirem a todo tipo de pecado
contra o Senhor. O desejo deles é romper completamente com as “amarras” do
SENHOR e do seu Ungido, formando uma conspiração politica e ideológica contra
Deus (Sl 2.1-3): Por que se enfurecem os
gentios e os povos imaginam cousas vãs? Os reis da terra se levantam, e os
príncipes conspiram contra o SENHOR e contra o seu Ungido, dizendo: Rompamos os
seus laços e sacudamos de nós as suas algemas.
Considerações Finais
O
homem foi criado perfeito, santo e justo, mas com a vontade mutável. Ele tanto
tinha a livre agência, que é a liberdade de tomar decisões de acordo com a sua
natureza, como também com o que chamamos de “livre arbítrio”, que era a
capacidade de tomar decisões contrárias a sua natureza santa.
Com
a Queda o homem perdeu a vontade contrária a sua natureza (livre arbítrio) para
sempre. Significa que sempre agirá em conformidade com sua natureza, no caso do
ímpio, será sempre escravo de si mesmo, do mundo e do Diabo (Ef 2. 1-1-3). No
caso do crente salvo pela graça, ele tem duas naturezas, a do velho homem e do
novo homem que se reveste de santidade em Cristo progressivamente (Cl 3.10). No
entanto, o crente sempre agirá de acordo com uma das duas naturezas, a que for mais
alimentada espiritualmente, e, portanto, não tem vontade contrária, ou livre
arbítrio, apenas age de acordo com a natureza.
No
estado de glória, o homem redimido por Cristo desfrutará de uma perfeição
absoluta e plena. Não terá mais pecado, maldições, dor ou sofrimentos! Sua
natureza será santa, reta e justa em Cristo! Logo, não terá vontade contrária
(livre arbítrio) o que nos garante que jamais voltaremos ao estado que a Queda
nos colocou, porque o segundo Adão cumpriu tudo em nosso lugar e nos garantiu
absoluta vitória! A Ele e ao Pai seja toda a glória eternamente!
Reverendo
Márcio Willian Chaveiro
(Essa reflexão teológica é
parte da apostila de Antropologia Bíblica do Instituto Bíblico Graça
Irresistível)
[2]
O estoicismo foi fundando por Zelão (335-223
a. C.). Defendia que a lógica era o que sustentava a física e a ética. Por essa
razão, a discussão sobre a liberdade humana foi
tão limitada pela lógica humana e não pela Escritura (fonte: SEERVELD,
C. G. Seerveld, Enciclopédia Histórico Teológica da Igreja Cristã, Vida Nova,
1992, p. 81-82
[3] MCGRATH, Alister E. Mcgrath, Teologia
Sistemática, Histórica e Filosófica, SHEDD, 2005, p. 507
[4] HOEKEMA, Anthony
Hoekema, 1999, p.251
[11] CAMPOS, Heber Carlos de Campos,
Apostila de Antropologia – não publicada
[12] SCHAEFFER, Francis A. Schaeffer, A Obra
Consumada de Cristo, Cultura Cristã, 2003, p.74
[18] CALVINO, João Calvino, AS INSTITUTAS, Volume I, Cultura Cristã,
2006, pp. 136-137
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